Assim como os versos “Sal de tantas perdas/cegou a luz do meu chão./Trouxeste as estrelas”, de Thiago de Melo, as imagens do artista José De Quadros, constituem um ato de sobrevivência. Suas pesquisas estão conectadas com a sobrevivência dos que sofrem segregação, racismo ou perseguição.
As obras do criador visual de Barretos, SP, instauram um processo de educação do olhar. Uma de suas características é convidar o público a observar melhor figuras muitas vezes apagadas, em que as entrelinhas conduzem a um pensamento que está além daquilo que inicialmente se observa.
Suas criações incluem pesquisas visuais do que está próximo, como seus ateliês, em Kassel, Alemanha ou no bairro do Itaim Paulista, na periferia da cidade de São Paulo, e do entorno deles, e sutis e contundentes críticas ao nazismo e ao genocídio dos armênios e de povos originários sul-americanos.
O fazer do artista é fundamentado geralmente em algum fato histórico, de modo que a sua estética caminha junto a ideais de liberdade e de rejeição à opressão. A sua alquimia pictórica é fundamentada, portanto, em narrativas individuais e/ou coletivas.
Objetos ou pessoas efêmeras, que se transformam com o passar do tempo, ganham uma ilusória eternidade na sua arte. Ela interrompe parcialmente o fluir da existência e, de certa forma, congela a dinâmica histórica que os discursos oficiais ou oficiosos alteram.
A paleta rebaixada e a perspectiva diferenciada, não frontal, levemente inclinada, proporcionam novas visualidades. Suas imagens funcionam como agitadas ondas a alegorizar a própria arte de viver, que nos fascina e, ao mesmo tempo, nos engole.
Os trabalhos de José De Quadros são um alerta da pequenez humana perante o universo e da magnitude da capacidade da mente de criar situações de potente reflexão sobre aquilo que nos rodeia de modo que cada fazer seja um lidar com permanentes mortes/nascimentos.
As imagens deste livro interpretam o mundo por constituírem um diálogo permanente com a sociedade sob diversos aspectos. Existe, acima de tudo, uma temática social horizontalizada que se posiciona contra qualquer tipo de preconceito, seja ele étnico, social, racial ou de gênero.
O artista constrói e desconstrói, enquanto adulto, o que vê e o que imagina como julga melhor. Foge do óbvio e do explícito e busca a universalidade na individualidade por uma óptica fundamentada na retroalimentação entre o fazer e o pensar.
O artista cria assim uma concretude encantatória. O fascínio está nas tonalidades mais baixas, nas formas misteriosas e na percepção de que sugerir é melhor do que enunciar. As criações utilizam ilimitados materiais, técnicas e suportes em um processo que constitui um permanente ato de construção individual e coletiva de novos olhares.
Oscar D'Ambrosio
Pós-Doutor e Doutor em Educação, Arte e História da Cultura, Mestre em Artes Visuais, jornalista, crítico de arte e curador.