A vulnerabilidade de adolescentes, principalmente negros, nas comunidades de todo o Brasil não pode ser normalizada. Acima de questões políticas e partidárias, estão as ausências dos que foram mortos ou feridos em ações violentas, assim como as dores e os sofrimentos dos que ficaram.
O direito à vida não é uma estatística. Deve vir sempre em primeiro lugar, como é possível visualizar na obra “Sonho Interrompido”, realizada pelo Coletivo Vermelho, composto por Adriano Dias, PB, Carminha, TO, Cecília Menezes, BA, Con Silva, SP, Dulce Martins, SP, Fátima Carvalho, CE, Gildásio Jardim, MG, Helena Coelho, RJ, Luciana Mariano, SP, Nonato Araújo, CE, Tito Lobo, PB, Val Margarida, PB, Vânia Farah, RJ, e Willi de Carvalho, MG.
A obra, selecionada para a 15ª edição da Bienal Naïfs do Brasil – Ideias para adiar o fim da arte., em Piracicaba, SP, em 2020, trata de homicídio de crianças e adolescentes, associado às dificuldades de exercer a cidadania nas mais variadas áreas, como a educação, a cultura e o lazer, numa realidade que é sumarizada, no trabalho, pela frase “- Bala, + Amor”.
No céu, o helicóptero que caça os bandidos, nem sempre corretamente identificados, convive com o simbolismo da leveza das pipas a carregar desejos. As palavras “Parem de nos matar” dialogam com a liberdade dos pássaros. Nesse sentido, perante o cenário de uma comunidade do Rio de Janeiro, RJ, cenas são justapostas lidando com projetos interrompidos.
A escultura mista, com dimensões de 90 x 80 x 20 cm, realizada em 2019, traz imagens que retratam a vida de uma comunidade com alegrias almejadas e tristezas vivenciadas: morte de crianças, gravidez, busca pelo diploma e jogo de futebol. Há ainda visualmente a intervenção pelas linhas de gambiarras de conexões de TV, elos com um mundo cada vez mais conectado.
A obra traz esses múltiplos elementos sem demonizar ou heroicizar a vida na comunidade. O conjunto expressa uma visão de mundo que não busca expressar a realidade das comunidades de maneira maniqueísta, mas gerar reflexão sobre como os sonhos de cidadãos brasileiros são podados perante uma sociedade desigual e violenta.
Oscar D’Ambrosio