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Pé, de Gil Verx

Pé, de Gil Verx
17/05/2021

Escultura em tela de arame fio 21 com banho em ouro, realizada em base de madeira pinho de riga, com 20 cm comprimento, 17 cm altura e 9 cm de largura, “Pé”, de Gil Verx, evoca a chamada podolotria (do grego “podos” – “pés” + “latria”, “adorar”), ou seja, uma adoração dos pés.

 

No Brasil, o tema foi tratado no romance “A Pata da Gazela” (1870), de José de Alencar, em que, ao contrário da célebre história de Cinderela, é uma jovem quem vai optar pelo mais adequado pretendente entre um sedutor e outro tímido, escolhendo quem a ame por suas características morais – e não apenas pela beleza física do pé, a pequena e sedutora “pata da gazela” do título da obra. Assim, o autor critica a sociedade do seu tempo como mais voltada para a aparência do que para a essência das pessoas.

 

Inadvertidamente, a obra de Gil Verx está, na fotografia, em uma estante ao lado de uma concha, símbolo ligado à deusa Afrodite. Gerada, segundo o mito grego, do esperma de Úrano (o Céu) derramado sobre o mar, a deusa do amor teria chegado às praias da ilha de Chipre dentro de uma concha, relacionada, portanto, ao nascimento, ao seio materno, à vagina feminina e ao útero.

 

Na Idade Média, a Igreja Católica, para apagar essa conotação ligada à sexualidade, difundiu a lenda em que um cavaleiro arrastado com seu cavalo para dentro do mar, teve a visão do Apóstolo Tiago, que o empurrou de volta às areias, ficando os seus corpos cobertos de conchas. Por isso, elas não passaram mais a ser vistas como símbolo da Afrodite grega ou da Vênus latina, mas ligadas ao Apóstolo.  As pessoas que visitavam o santuário de São Tiago em Compostela, Espanha, traziam então das praias da região uma concha para testemunhar que passaram por ali.

 

Portanto, a escultura de Gil Verx associada ao objeto na prateleira traz a possibilidade de pensar tanto na sensualidade do pé e da vagina (concha), como na espiritualidade de escolhas baseadas nas essências, defendida por José de Alencar, e do encontro dos peregrinos com as relíquias de São Tiago.

 

Oscar D’Ambrosio