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Pílula visual: Batom no Holocausto

Pílula visual: Batom no Holocausto
04/01/2021

Muito se discute o que é o belo na vida na arte. Talvez uma das melhores entradas para discutir o assunto em termos de arte contemporânea esteja na obra conhecida como “Batom no Holocausto”, de Bansky. A imagem. que acompanha este post, está publicada no livro “Bansky: Guerra e Spray” (Intrínseca, 2012) ao lado de um texto que o artista encontrou no Imperial War Museum.

Trata-se de um excerto de um depoimento do tenente-coronel Mervin Willett Gonin Dso, que foi, em 1945, um dos primeiros soldados britânicos a libertar o campo de extermínio nazista de Bergen-Belsen. O texto conta os horrores do local e como o ânimo das mulheres se alterou com a chegada de um grande carregamento de batom:

“Elas ficavam prostradas na cama sem lençóis ou camisolas, mas com os lábios pintados de escarlate. Você as via perambulando, com apenas um cobertor sobre os ombros, mas com os lábios pintados de vermelho vivo. Vi uma mulher morta na mesa do necrotério e ela tinha na mão crispada um pedaço de batom. Afinal alguém tinha feito algo para torná-las novamente indivíduos, não mais identificadas apenas pelo número tatuado no braço. Afinal, alguém se importava com sua aparência. O batom começou a devolver a elas sua humanidade.”

O belo, como se depreende dessa narrativa, está intrinsecamente ligado à humanidade e à autoestima. Mais importante do que aquilo que se pode chamar de esteticamente belo, está o que se pode nomear de profundamente humano. É ao se atingir esse estágio que a arte se torna densa e bela, como comprova a obra de Bansky.

Oscar D’Ambrosio