De onde nasce isso que chamamos de arte? Está dentro de cada um de nós? Reside no mundo e dela nos apropriamos? Ou somente se realiza quando o trabalho está pronto? Ou ainda apenas se concretiza quando uma outra pessoa observa aquilo que é feito? O processo fascina e nos conquista, mas sua plena compreensão está longe de acontecer. Que bom!
Esse feliz desconhecimento, apesar de inúmeras teorias existentes, vem à tona perante trabalhos como “Os chinelos do meu pai”, de Cecília Rodrigues, de Sorocaba, SP. O objeto provém do pai da artista, viúvo, 76 anos, aposentado, que cuida com amor de um pé de acerola em seu quintal.
Daí surgem, na representação da artista, os pedaços de grama, barro e folhas secas em volta dos calçados que protegem seus pés. Ele também sempre gostou de lidar com construções e reformas, pintando e decorando com seu estilo. Daí os pingos de tinta branca sobre os elásticos laranjas dos chinelos.
De onde vem a arte então? Da história do pai de Cecília? Dos seus chinelos? Da pintura sensível e bem realizada da artista? Dos nossos olhos de observadores da obra? De todas essas facetas? Não parece haver resposta certeira, mas trabalhos como este demonstram que a arte felizmente conserva o papel de nos interrogar e emocionar. Não é pouco.
Oscar D’Ambrosio é jornalista pela USP, mestre em Artes Visuais pela Unesp, graduado em Letras (Português e Inglês) e doutor em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Gerente de Comunicação e Marketing da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Coordena o projeto @arteemtempodecoronavirus e é responsável pelo site www.oscardambrosio.com.br