O trabalho de Marli Takeda com adesivos reciclados mostra uma progressiva transformação para o alcance de reflexões filosóficas sobre a arte. Seja uma expressão da tristeza ou da alegria do existir ou mesmo a busca de uma representação mais próxima do que se entende como real, criar é interpretar um sentido para a vida.
Fuga da morte pelo desejo de ser perene ou ato mágico em si mesmo, fazer arte é se relacionar com o mundo. Nesse aspecto, Marli Takeda, em “As águas de cima voltam a se misturar com as de baixo” traz indagações sobre o fluir e o movimento. A predominância do branco e de tonalidades de azul transmitem uma atmosfera de harmonia e calmaria.
Existe o vermelho que alerta para a paixão da existência. É como se, em meio a um certo fluir e refluir da existência, houvesse pontos intensos, talvez de transformação, mas, acima de tudo, que demandam uma atenção especial. Há também outros instantes, como alguns em amarelo e dourado, que podem ser cruciais na interrupção do mover contínuo das águas da vida.
Se o filósofo grego Heráclito de Éfeso dizia que “O mesmo homem não se banhava no mesmo rio”, pois a pessoa e a água mudavam ao longo do tempo, a obra de Marli Takeda cria uma análoga relação visual, pois as águas visuais criadas pela artista têm efeito semelhante, renovando-se cada vez que as olhamos. Afinal, a cada momento somos diferentes.
Esta obra faz parte da Coletânea do Projeto Dias de Reclusão.
Oscar D’Ambrosio é jornalista pela USP, mestre em Artes Visuais pela Unesp, graduado em Letras (Português e Inglês) e doutor em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Gerente de Comunicação e Marketing da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Coordena o projeto @arteemtempodecoronavirus e é responsável pelo site www.oscardambrosio.com.br