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Bruno Corrente Andriani

Bruno Corrente Andriani

Uma ópera humana

O Trabalho de Conclusão de Curso de bacharelado em Artes Plásticas de Bruno Corrente Andriani, intitulado Q=3/K=0: três mulheres por quatro naipes apresenta 12 fotomontagens manipuladas digitalmente impressas a jato de tinta em lâminas de papel tamanho A4 a serem coladas sobre papel craft.
  Além da mística que os números 3, 4 e 12 apresentam, o resultado final pode ser considerado decorrente de uma contínua pesquisa marcada pela insatisfação. Nesse sentido, a paixão pela velocidade dos processos e pelas fotografias polaroid desenvolvidas por David Hockney são importantes.
  A manipulação digital alia-se ao desenho para concluir imagens que escapam às meras categorias de Virgem, Mãe e Anciã, numa perspectiva mítica, ou Mãe Biológica, Tia e Avó, numa leitura biográfica. Os desenhos e fotos digitais passam por uma fase de seleção e de interferências variadas que podem, à primeira vista, despertar o risco de que alguém considere que o conceito artístico tem mais valor que a obra em si mesma.
  No entanto, é o trabalho de Bruno que fala mais alto. As quatro primeiras obras, que partem do rosto de uma mulher jovem, ilustram bem a sedução do trabalho. O olho pontuado de vermelho, num conjunto bem enquadrado, a destruição do referente, a presença do vermelho como componente de sensualidade, mas, ao mesmo tempo, de certa ingenuidade, e a interrogação de uma imagem em que o branco já se faz mais presente, dialogando com os cabelos pretos, cria um mistério a gerar constantes indagações.
  O segundo quarteto impede a visualização, mas trabalha com as cores e com a própria idéia da rainha a que as cartas do baralho aludem e o que elas representam. A imagem desaparece, mas surge com inegável força como um coração rasgado, calcinado talvez. Aquilo que não está óbvio vale mais que o que se vê. É no buscar que a procura se torna mais importante que tudo. A interrogação obriga a criar idéias e, por sua vez, as estimula num círculo virtuoso.  O perguntar contribui para dar um passo além rumo à jornada por mulheres e cartas que estabelecem um mundo à parte.
  O terceiro quarteto é novamente marcado pela figuração mais explícita. Há alguém lá, mas esse ser aparece selecionado, transformado, digitalizado, evocado, enfim, de diversas maneiras. Principalmente nas cores mais quentes, parece queimar em seu discurso. Seja nos perfis ou imagens mais frontais, tem algo a dizer, mas parece saber, pelo afastamento que os amarelos e vermelhos geram, que não existem pessoas dispostas ou prontas a ouvir. Mesmo assim, permanece lá. Contempla, observa e, se puder, falará. Estarão os observadores prontos a escutar?
  Entre a primeira e a última imagem, o perfil se inverte, a figura central se esfacela e os olhos sofrem igual recorte. Aquela seduz pela beleza, indaga pela inacessibilidade. Esta fascina pela passividade, ameaça pelo potencial realizador. Ambas estão ali, prontas para agir. Bruno Corrente Andriani as desenhou, fotografou, selecionou, manipulou digitalmente, emocionalmente, fez sua trajetória. Oferece um painel de três rainhas. O rei ausente talvez seja ele, a comandar uma ópera humana em que o compositor rege com o talento e a criatividade caminhando lado a lado, observando-se mutuamente com admiração e respeito.