
Discutir qual é o melhor livro de Clarice Lispector sempre é difícil e inglório. ‘Água Viva’, de 1973, sempre foi o meu preferido, entre outras razões, pelo fato de não haver ali uma história reconhecível, mas uma interpretação do mundo em que a Arte tem espaço com letra maiúscula.
O livro ‘Clarice Lispector e as fronteiras da linguagem: uma leitura interdisciplinar do romance Água Viva’ (Benjamim Editorial), de Ivan Hegenberg, lança novas luzes na obra com um diálogo entre a obra e as artes visuais. A imagem que ilustra este post, chamada ‘Medo’ (1975), de Clarice, ajuda justamente a criar pontes infinitas entre as artes.
Não se trata de entender a escritora como uma grande pintora, mas de ver nela uma criadora que pensa todas as manifestações artísticas como inter-relacionadas no sentido de conceber o mundo interior como uma resposta ao mundo exterior; e este como uma projeção do que cada um desejaria ver e ser.
A escrita de Clarice e as suas imagens são uma maneira de a artista manter uma relação com aquilo que se entende como real. E aí surge o maior desafio dos autênticos criadores: conseguir dialogar com o mundo com densidade sem perder as referências concretas que nos conectam com os mundos interno e externo. Ao discutir estas questões, o livro de Hegenberg merece uma leitura carinhosa e atenta.
Oscar D'Ambrosio, mestre em Artes Visuais, doutor em Educação, Arte e História da Cultura. Este e outros textos estão disponíveis em www.oscardambrosio.com.br. Contato: odambros@uol.com.br